sexta-feira, 5 de setembro de 2008

O QUE É ARTE?

Afinal de contas, o que é arte?
por Sarah Lee

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A pergunta que não quer calar
Pode falar a verdade: você sabe o que é arte? Entende as grandes obras ou costuma pensar “ah, isso eu também faço”? E sobre a produção artística, acha que é uma coisa subjetiva, uma inspiração que vem do nada? O ONNE falou com grandes nomes do mundo das artes para esclarecer essas questões e tirar a limpo tudo o que você sempre quis saber, mas nunca teve coragem de perguntar!


A célebre Mona Lisa, de Leonardo da Vinci


Antes de tudo: afinal de contas, o que é arte? Como Domingos Tadeu Chiarelli* explica, até meados do século 18 ainda não havia uma divisão precisa entre as artes visuais (pintura, escultura, desenho, etc) e outras habilidades artesanais, ou seja, essa é uma questão relativamente recente (e complicada). Mas, basicamente, a idéia é encarar a arte como algo que proponha soluções ou questionamentos para um paradigma contemporâneo.

Chiarelli exemplifica: “No caso da Mona Lisa, ela foi ganhando importância porque em um simples retrato o artista sintetizou todo o conhecimento sobre como a pintura poderia retratar o entorno, dando à figura humana um caráter central. Ali, não era mais a religião que era valorizada, mas o ser humano, senhor absoluto do seu destino”. Ele explica que, hoje em dia, essa questão pode parecer banal, mas que no período de Leonardo da Vinci, discutir o papel do homem frente ao universo era um problema crucial – daí a importância e a valorização da Mona Lisa até os dias de hoje.

E o reconhecimento? Você certamente já ouviu falar de artistas que morreram na miséria, mas cujos quadros valem fortunas atualmente. De acordo com Chiarelli, isso acontece porque o artista pode propor soluções que estejam além da possibilidade de compreensão dos seus contemporâneos – ou seja, suas idéias só são valorizadas pelas gerações seguintes, estimuladas por problemas que antes não eram escancarados.

Guernica (1937), de Pablo Picasso


Isso não quer dizer que artistas são seres superiores que nascem para fazer coisas geniais. Agnaldo Farias** explica que essa idéia de arte subjetiva que nasce do nada é pura invenção dos artistas românticos, que queriam se apresentar como mais importantes que os outros homens: “Mesmo na história da gastronomia, ninguém tem pretensão de inventar uma pizza. Inventar uma pizza, só tendo comido muita pizza e sabendo o que poderia ser novidade nesse campo. Em qualquer campo existe conhecimento prévio acumulado, ninguém cria algo a partir do nada”.


Bicycle wheel (1913), de Marcel Duchamp

E quanto aos grandes mestres serem representes de movimentos artísticos? Outro mito! De acordo com Farias, “essas tentativas de caracterização dos determinados grupos de artistas são um bom ponto de partida, mas um péssimo ponto de chegada”.

Isso porque, ele elabora, os movimentos dão a sensação de uma coisa muito acabada e, a rigor, Picasso é maior do que o Cubismo e Monet é maior que o Impressionismo, por exemplo. Assim, os movimentos servem para você se situar cronologicamente e reunir semelhanças, mas os grandes mestres se destacam justamente por mostrarem problemas particulares, soluções peculiares, por serem inventores de novas possibilidades.

Tudo bem, mas... e quanto a obras como a de Marcel Duchamp, com a roda de bicicleta sobre um banco? Qual o problema e a solução discutidos? Tadeu Chiarelli explica: “Aquilo foi uma estratégia do artista para discutir os limites que a arte colocava para si mesma. Para mostrar que a arte, antes de ser um objeto puramente artesanal ou "estético", é uma atitude de cunho social. Colocando, no lugar de um objeto artesanal (uma pintura, por exemplo), uma roda de bicicleta (um objeto industrializado), Duchamp chamava a atenção para o fato de que o sentido da arte não está no objeto artesanal, único e precioso. Ele está na própria história”.

Obra de Tomie Ohtake na Av. 23 de Maio, em São Paulo



Agora que você já sabe o básico, pode ir a exposições de arte preparado para fazer bonito! Chiarelli dá a dica: “O importante é você se aproximar de uma obra sem preconceitos de nenhuma espécie e tentar descobrir o que ela está propondo para você e como ela mesma responde a essa proposição”. Tomie Ohtake*** dá um empurrãozinho para quem ainda tem medo de errar: “Arte é expressão de originalidade, de idéia e de uma poética. Não existe um jeito errôneo de ver a arte, mas ângulos pessoais”.


*Domingos Tadeu Chiarelli: historiador, crítico de arte e curador, tem graduação, mestrado e doutorado pela Universidade de São Paulo. É professor junto ao Departamento de Artes Plásticas e orientador junto ao Programa de Pós-Graduação de Artes Visuais. Entre 1996 e 2000 foi Curador-Chefe do Museu de Arte Moderna de São Paulo, do qual, hoje, integra a equipe de diretores. Em agosto/2007 foi eleito Chefe do Departamento de Artes Plásticas e atualmente coordena o Centro de Estudos de Arte & Fotografia e o Grupo de Estudos de Crítica de Arte e Curadoria, ambos no Departamento de Artes Plásticas da ECA-USP. Tem livros publicados sobre Arte e Crítica de Arte no Brasil.

**Agnaldo Farias: crítico de arte, curador e professor doutor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Realizou curadorias para o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Instituto Tomie Ohtake, Centro Cultural Banco do Brasil e para a Fundação Bienal de São Paulo, entre outros. Foi Curador Geral do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (1998/2000) e Curador de Exposições Temporárias do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (1990/1992). Atualmente é consultor de curadoria do Instituto Tomie Ohtake. Tem livros publicados sobre Arte e Crítica de Arte no Brasil.

*** Tomie Ohtake: considerada a "dama das artes plásticas brasileiras” pela carreira consagrada em 50 anos de trabalho, é uma das principais representantes do abstracionismo informal. Sua obra abrange pinturas, gravuras e esculturas, muitas delas em espaços públicos. Já realizou cerca de 50 exposições individuais e 86 coletivas, no Brasil e no exterior.

Fonte:
http://msn.onne.com.br/conteudo/5129/afinal-de-contas-o-que-arte

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